Do mesmo ponto testemunhei, nos últimos anos, estenderem-se rumo ao céu alguns espigões – poucos, mas suficientes para abrigar parcela substantiva da cidade em que nasci, lá longe. A provinciana Ponta Grossa definitivamente já não é mais dada a campesinatos, antes esboça passos cada vez mais duros para uma modernização que virá para males e bens, e em nenhum desses caminhos acertará ou errará sozinha, pois esquecer o passado é o tributo que se paga pela necessária incorporação às cadeias cada vez mais amplas de produção e, quando as coisas se passam assim, se passam como não poderiam se passar diferentemente. O que perfura e mata, e ainda não se fala disso com o arrebatamento merecido, são os efeitos colaterais. O dilema da automação algorítmica e da computação quântica como a tuberculose de nosso tempo, ou como mero catastrofismo dos inimigos da inovação, terá nos Campos Gerais um cenário como qualquer outro. Anyway, ainda é cedo para ruminar o vindouro inferno tecnológico de Musk et caterva, e o cenário convida a sair pela vertente lírica.
"Numa noite, ou num dia (...)/ Tudo aquilo que vemos ou nos parece/Nada mais é do que um sonho dentro de um sonho", (Edgar Allan Poe - Séc. XIX), e é assim que tudo
parece visto deste ângulo, antes de descermos e nos integrarmos ao sonho e à coletividade que nada tem de sobrenatural além de estar sobrenaturalmente incorporada ao processo de viver, ao jogo dos interesses no balanço das pulsões e apetites, destinos que se cruzam no imenso caudal da experiência humana.
Naturalmente mais voltado a identificar os ângulos retos e as arestas do que as harmonias em geral, jamais me afeiçoei ao subgênero "texto de amanhecer", instituição sólida da Crônica. Acordei mais cedo e me saiu um. Deve ser inspiração do "Corvo" Allan Poe, esse equilibrista da treva e da luz.