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Parole

Era uma vez Renato Russo

Por Edgar Talevi de Oliveira

 

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   “Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração”?
  O Brasil caminha a passos largos a um tempo de obscurantismo, despotismo, extremismo acirrado, em que a luta pela subsistência é travada em meio ao repugnante preconceito contra o direito de existir como pessoa, com todas as suas diferenças.   
   O lado dos que pregam a democracia da maioria engrossa a fila dos incautos que, vislumbrados com o retrocesso do conservadorismo fundamentalista – aqui não incluo o pensamento conservador, em suas pautas comportamentais, mas o radicalismo da autocracia – prerroga a si o direito de erigir o discurso do ódio e da não aceitação da diversidade, ferindo de chaga mortal a garantia dos direitos humanos.
   Quase sem querer, o pensamento libertário e crítico do início da década de 80, em que havia um movimento de ruptura institucional no Brasil, em uma

incipiente democracia civilmente instituída, torna-se necessário ao disruptivo processo civilizatório de uma sociedade que sobrevive a abusos políticos, econômicos e morais, chafurdando nas mazelas das disputas de espaço dentro de um pretenso Estado Democrático de Direito, que não garante o mínimo de pluralidade aos seus cidadãos.

    Chegamos a pensar que muitos temores nascem do cansaço e da solidão, versos da canção em que Renato Russo demonstra sua ávida e acurada visão holística além de seu tempo, como que antevendo o futuro derrotista e cético em que se encontra a nação. Destarte, nunca se viu tamanho preconceito, em uma sociedade em pleno século XXI, momento em que as crises deveriam, em tese, ser resolvidas pela inclusão das minorias excluídas do debate e dos espaços políticos e religiosos e, a hodierna pandemia, confutada pela douta diretriz da ciência.

     Mas, o que se vê é que os assassinos estão livres, nós não estamos; e mais: os meus amigos todos estão procurando emprego. Some-se a tudo isso o fato de que hoje a tristeza não é passageira, nesta que é a Via Láctea da sociedade moderna, haja vista as vicissitudes de quem não quer que se propague a mensagem para que o presidente ajude toda essa gente que só faz sofrer. E, assim, vivemos nosso Faroeste Caboclo de cada dia, com os milhões de desempregados e a violência a números alarmantes.

    Talvez, quando Renato Russo e sua Legião Urbana cederam voz aos oprimidos, tais como na letra de “Meninos e Meninas”, estivessem vociferando contra o preconceito que aflige pessoas com variadas orientações sexuais, ou, ainda, permitindo à cultura e à arte o engajamento imprescindível às pautas que perfazem a dialética de uma contracultura necessária aos tempos atuais. Fazem-nos falta Renatos Russos em dias atuais!

     Não obstante, Pais e Filhos se veem distantes, absortos pela falta de diálogo. Não há mais agenda que permita ao homem de “negócios” encontrar o próprio filho dentro de casa, pois o lar já não é mais o teto sob o qual todos habitam, pois perdeu seu conceito estrutural de abrigo. Daí ser preciso lembrar de que é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã.

      Estamos, aos poucos, perdendo-nos entre monstros da nossa própria criação. Mas, será? Será só imaginação? Será que nada vai acontecer? O Teólogo alemão, Dietrich Bonhoeffer, outrora, disse: “O silêncio diante do mal é o próprio mal”. Isso, ou nos mata, pela estupidez de nossa passividade, ou torna-nos mais resilientes e, neste caso, cobiçosos de tempos melhores.

    Podemos até pensar que, mesmo com tantos motivos pra deixar tudo como está, devemos interagir, agir, pugnar diante do malfeito, dos desmandos e das equivocidades. Não cometamos o erro de mentirmos a nós mesmos em tempos de perpetuidade da hipocrisia. O direito de sermos apenas nós mesmos é inalienável, irrevogável e inegociável.

    Enquanto vivermos, saibamos que nunca estaremos à altura de nossos sonhos se não permitirmos que o nascituro futuro venha pela luta presente, pois sabemos que o discurso da pós-verdade afirma que o que foi prometido, ninguém prometeu, mas, ao mesmo tempo, não é tempo perdido, pois somos tão jovens!

    Quem sabe seja a hora em que possamos cantar juntos o hino nacional, pois a lágrima é verdadeira, celebrando nossa saudade e comemorando a nossa solidão, conforme Renato, o Russo, canta em “Perfeição”

    Porém, prezados leitores, a mensagem que fica como legado em nossos corações, de quem deixou sua alma nas letras de sua Legião de fãs, Urbana ou não, estimule a que cada um de nós viva o melhor de seus dias, pondo a felicidade onde ela merece e deve estar, dentro de nós mesmos.

     Valha-nos a letra de “O mundo anda tão complicado”, e, façamos, talvez por amor, ou, quem sabe, por rearranjo em nossas vidas, o que propõe o saudoso, mas sempre presente, Renato Russo: “Quero ouvir uma canção de amor, que fale da minha situação, de quem deixou a segurança de seu mundo, por amor”.

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Edgar Talevi de Oliveira, licenciado em Letras pela UEPG; pós-graduado em Linguística,  Neuropedagogia e Educação Especial; bacharel em Teologia pela UNINTER; mestre em Teologia pelo SETEPE; membro da Academia Ponta-Grossense de Letras e Artes; autor do livro Domine a Língua - o novo acordo ortográfico de um jeito simples, em parceria com Pablo Alex Laroca Gomes; autor do livro Sintaxe à Vontade - crônicas sobre a Língua Portuguesa; professor de Língua Portuguesa do Quadro Próprio do Magistério do Estado do Paraná; revisor profissional de textos acadêmicos; e articulista de diversos jornais municipais e estaduais.