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CONVERSAS ESPECIAL

MARILIZ PEREIRA JORGE

Celebridade ponta-grossense no jornalismo brasileiro, jornalista Mariliz diz que 'os jornais não vão acabar'
por Eduardo Gusmão
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Mariliz Pereira Jorge (Foto divulgção)

   Hoje, ela se sente adaptada ao Rio de Janeiro, onde reside há 12 anos, depois de morar 16 em São Paulo, logo após concluir Comunicação Social – Jornalismo pela UEPG. Com satisfação e muito prazer em aceitar meu convite para esta entrevista, me sinto feliz em poder me referir à pessoa da jornalista ponta-grossense Mariliz Pereira Jorge como colunista de sucesso pela Folha de S.Paulo, onde escreve sobre assuntos do cotidiano (comportamento, relacionamentos, sexo, amizade, entre outros), sempre às terças e quartas-feiras  (site da Folha).

Nesta breve abertura para destacar alguns momentos de assuntos tratados nessa conversa, preferi apenas ressaltar que a jornalista e roteirista Mariliz Pereira Jorge acredita que os jornais não vão acabar como se ouve por aí, há algum tempo, mesmo porque “os veículos tradicionais vêm se adaptando ao novo tipo de leitor e às ferramentas disponíveis.”

   Mas, pra quem ainda não conhece a trajetória de Mariliz Pereira Jorge, um dos maiores talentos do jornalismo brasileiro revelados nos últimos anos, vai entender porque Ponta Grossa se orgulha da carreira de sucesso de sua conterrânea. Em sua plena juventude ainda, Mariliz foi repórter de importantes revistas como Veja, Marie Claire, VIP, entre outras. Com passagem pela TV Globo, ela foi editora e roteirista do programa Encontro com Fátima Bernardes, além de ter escrito para o Fantástico, líder de audiência da emissora carioca. Na Folha de S.Paulo, Mariliz trabalhou entre 1999 e 2003, marcando sua presença como editora da extinta Revista da Folha (2006/2007), com participação também na coluna Rio do grupo. Atualmente, absorvida pelo trabalho do dia a dia, ela foge do livro que a espera para ser terminado ainda neste ano. “Mas uma hora, ele sai”, diz ela.

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Mariliz Pereira Jorge e Fátima Bernardes

   TNOT - Mariliz, você nasceu em Ponta Grossa (PR), e hoje reside no Rio de Janeiro. Como foi se adaptar às diferenças culturais, sociais e políticas entre essas duas regiões do Brasil? Você se sente mais identificada com alguma delas?

   MPJ - Isso foi acontecendo aos poucos. Eu me mudei para São Paulo assim que terminei a faculdade em Ponta Grossa, onde morei 16 anos, com um intervalo de quase três, que passei fora do Brasil. Estou há 12 anos no Rio. Sempre há um período de adaptação em qualquer mudança, mas eu sempre gostei de viajar, de conhecer novas cidades e culturas, tenho uma curiosidade natural pelo desconhecido, o que sempre facilitou a minha vida no sentido de estar aberta ao novo. Hoje, estou muito adaptada ao Rio, onde eu levo uma vida com um estilo parecido com o que tinha quando morava no Paraná, muito contato com a natureza. Eu sou meio camaleão, me adapto ao ambiente.

   TNOT – Faz algum tempo que você se destaca como uma das colunistas mais lidas da Folha de S.Paulo, com incursões notáveis pelo canal Meio no YouTube, além de outros veículos ao longo de sua carreira como jornalista e roteirista. Com essa experiência, como você avalia o papel da imprensa e das mídias digitais na formação da opinião pública e na fiscalização dos três poderes? Você acha que há espaço para o jornalismo independente e crítico no Brasil atual?

   MPJ - Desde que eu me formei, e lá se vai muito tempo, ouço que os jornais vão acabar, que o jornalismo vai acabar. Não aconteceu e nem vai acontecer nada disso, o que temos visto é transformação. Os veículos tradicionais se adaptando ao novo tipo de leitor e às ferramentas disponíveis. Há um crescimento de leitores entre o público jovem, assim como os jornais entenderam que não podem estar de fora das novas mídias. Nos Estados Unidos, mais de 30% das pessoas se informam por redes sociais, não deve ser diferente por aqui. Então, você vê cada vez mais jornais como a Folha com conteúdo no Instagram, Facebook, TikTok. Também vemos o surgimento do que se chama de Info-encers, que nada mais são do que influenciadores que se destacam como fontes de notícias, muitos são jornalistas de formação. Eu me considero uma Infoencer, além do que publico por meio da Folha de S.Paulo ou do canal Meio no YouTube, muitas pessoas me acompanham nas redes para se informar. Então, o jornalismo vai se transformando, mas o público entendeu que precisa escolher bem as suas fontes. Nos últimos anos, a explosão de fake News ajudou também a mostrar a importância dos veículos tradicionais, que têm estrutura e mão de obra qualificada para fiscalizar o poder público. Sempre haverá espaço para jornalismo independente e crítico, infelizmente muita gente prefere se informar de acordo com as suas crenças e mergulha numa bolha que se alimenta de notícias que apenas agradam o seu paladar. É o viés da confirmação. Acho que é uma questão de escolha. Você pode se perguntar: quero me informar ou quero apenas ler as notícias que me agradam?

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   TNOT - Você se define como feminista e aborda temas como saúde, relacionamento, política e cultura em seus artigos e crônicas. Atualmente, o Brasil tem mais de dez milhões de empresárias, mais mulheres que estudam e trabalham, mas que ganham pouco mais de 20% menos do que os homens, embora ocupem 34% em cargos de lideranças em bancos e fintechs. Neste aspecto, como você vê o movimento feminista no Brasil hoje? Quais são as principais conquistas e desafios das mulheres brasileiras? Aliás, como a jornalista Mariliz lida com as críticas e os ataques que recebe nas redes sociais por defender suas posições?

   MPJ - As mudanças acontecem devagar, mas estamos caminhando e conquistando espaços. Já somos a maioria nas universidades, já ocupamos espaço em cursos que eram considerados masculinos como engenharia e tecnologia. É uma questão de tempo. Há muita coisa ainda a ser conquistada. Mas felizmente estamos falando todos os dias sobre desigualdade, violência, maternidade, envelhecimento. São assuntos que frequentam a mesa do brasileiro todos os dias. O movimento feminista é muito plural, inclusive porque as mulheres são muito diferentes, eu prefiro focar nos assuntos que são comuns a todas, como a importância de mais participação política, mais oportunidades profissionais, divisão de tarefas domésticas (sem isso, que mulher consegue se desenvolver profissionalmente?) e violência. A violência está presente na vida de mulheres de todas as idades e de todas as classes sociais. É um assunto que precisa ser encarado, debatido e combatido como sociedade. E eu falo de todos os tipos de violência, inclusive o assédio moral. Tenho enfrentado isso há anos como profissional, faz parte, mas as pesquisas estão aí para mostrar como as mulheres jornalistas foram os alvos preferidos de políticos nos últimos anos. O meu nome figurou em alguns rankings, como no da organização internacional Repórteres Sem Fronteira. É um pódio que eu não gostaria de frequentar, mas é o ônus de praticar a liberdade de expressão garantida na Constituição. Os ataques têm o objetivo de me intimidar, me parar, mas na verdade, só me fortalecem porque sei que estou apenas fazendo o meu trabalho. Os incomodados que procurem outra profissão.

   TNOT – Em sua trajetória profissional, você acompanha de perto a política brasileira, que se encontra dividida, pragmaticamente, em dois polos distintos: o da extrema direita e o da esquerda xiita, concorda? Isso enfraquece o pensamento criativo dentro da seara política, fomentando a agressividade no debate das pautas primaciais da nação. Pra quem já entrevistou diversos políticos e personalidades, como você analisa o cenário político atual, marcado por essa polarização e, entre outros fatores, pela instabilidade econômica e erosão das instituições democráticas? Enfim, de que modo seria possível trazer o equilíbrio novamente para a práxis política a fim de promover uma agenda positiva para o Brasil? Quais são as suas expectativas para as eleições de 2024?

   MPJ -  Estou bem pessimista. As eleições em 2024 já terão um caráter nacional, veremos a mesma polarização que vimos na eleição presidencial. E tudo pode piorar com uma possível prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro, que vai usar isso como ferramenta para se colocar como um mártir, exatamente como fez quando foi vítima de um atentado antes da sua eleição em 2018. Perde o Brasil, porque continuamos sequestrados por essa agenda que aposta em mais briga e menos debate. Questões municipais e estaduais ficaram esquecidas. Políticos levarão para a arena pautas que nem lhes competem porque são da alçada do governo federal, do Congresso nacional, mas que provocam barulho e mexem com o imaginário popular. 

   TNOT – Diante de tantas questões relevantes em discussão pela Câmara dos Deputados e Senado, ultimamente, qual dessas pautas poderá ser mais impactante ou não nas campanhas das Eleições Municipais deste ano: Demissão por motivo ideológico poderá ser crime; Utilização da Inteligência Artificial nos processos eleitorais; Propostas para acabar com a reeleição de prefeitos, governadores e presidente da República; Novo Código Eleitoral, incluindo quarentena para militares; Senado aprova PEC que criminaliza posse de qualquer quantidade de drogas; Debate sobre a violência nos chats de jogos online, etc.

   MPJ - Como eu disse, qualquer pauta que renda vídeo para que os candidatos abasteçam as redes sociais, viralizem e consigam ficar em evidência, independentemente, se eles têm competência para legislar sobre. Em geral, são as pautas de costumes, drogas, aborto, direitos da comunidade LGBTQIA+, ideologia de gênero, banheiro misto, essas coisas que deixam as pessoas apavoradas, mas que não podem ser decididas no âmbito municipal ou estadual. Será uma das piores eleições desde a redemocratização, um festival de baixaria e manipulação.

   TNOT- Ainda sobre a política brasileira, se não for demais lhe perguntar, a que você atribui ou a que se deve o crescimento de partidos de Centro e ao encolhimento de partidos de esquerda, entre eles o PSDB? Neste sentido, como você observa o “bolsonarismo” depois dos últimos acontecimentos a respeito da tentativa de golpe em 8 de janeiro de 2023? Aliás, cabe aqui mais esta questão: o avanço da extrema direita pelo mundo afora pode nos afetar em um futuro próximo?

   MPJ - PSDB morreu. Vai encolher cada vez mais até desaparecer. O centro cresceu porque tem flexibilidade ideológica, prioriza acesso ao poder e aos recursos do Estado sobre compromissos pragmáticos rígidos. Dada a fragmentação partidária, nenhum partido frequentemente consegue uma maioria absoluta no Congresso. Assim, governos sucessivos, independentemente de sua orientação ideológica, precisam formar coalizões para garantir governabilidade. O centrão, por sua capacidade de mobilizar um número significativo de votos no Congresso, torna-se um parceiro atraente para essas coalizões, garantindo-lhe influência e acesso a recursos e cargos no governo. O bolsonarismo se firmou como ideologia, gostemos ou não, mas é uma ideologia multifacetada, combina elementos de conservadorismo social, nacionalismo, liberalismo econômico (em certa medida) e uma forte oposição ao que seus seguidores consideram como "esquerda política". Mas o bolsonarista tradicional considera de “esquerda” qualquer pessoa que faça oposição a seus políticos e suas ideias conservadoras, com ênfase na família tradicional, oposição a direitos LGBTQIA+, ao movimento feminista, que eles nem sabem exatamente do que se trata, legalização da maconha, um movimento que é mundial. Fortemente nacionalista e patriótico, se coloca como anti-establishment, mas elege políticos que estão aí há décadas. E tem toda aquela baboseira de achar que o país sofre uma ameaça comunista, coisa que nunca aconteceu e nem acontecerá, mas serve como pauta para que os políticos amedrontem os eleitores mau informados. Estão super alinhados com governos conservadores e direitistas globais. Ainda estamos aprendendo a lidar com isso.

   TNOT – Em se tratando da política paranaense, apenas por curiosidade: você acompanha o que se passa pela Assembleia Legislativa e Governo do Estado? Particularmente, você tem notícias a respeito das especulações em torno das pré-candidaturas a prefeito de sua terra natal? Se tiver alguma consideração a fazer, agradecemos.

   MPJ - Tenho acompanhado muito pouco. A política nacional acaba ocupando muito tempo. Aliás, não consigo acompanhar tudo. Rio de Janeiro e São Paulo também sempre estão no radar, porque um é o estado em que moro, o outro é o mais importante do país, que dita muito do que acontece no restante.

  TNOT – Com três livros de crônicas publicados e alguns prêmios, quais são as suas principais referências e inspirações literárias? Ainda neste aspecto, como você concilia o trabalho jornalístico com a literatura? Você tem algum projeto de livro em andamento ou em mente?

MPJ - Eu não tenho livros lançados ainda. O primeiro deve sair este ano. A demora se deve justamente pela dificuldade em conciliar as duas coisas. Eu acabo sendo absorvida pelo trabalho do dia a dia e fujo do livro que me espera para ser terminado. Mas uma hora ele sai.