O capitalismo, tal como visto no pensamento político norte-americano, com suas vertentes atuais ressignificadas no Neoliberalismo pós-consenso de Washington, descreve uma democracia pluralista, em que o gerenciamento da liberdade individual no mercado e consequente poder político dão embasamento ao crescimento da expectativa do desenvolvimento pessoal por meio da meritocracia, o que já foi criticado por eminentes teóricos, tais como Philippe Schmitter, Alfred Stepan e Leo Panitch. Afinal, para esses autores, há um legítimo questionamento sobre o caráter democrático da teoria liberal, haja vista sua consolidação na égide da independência total do indivíduo frente ao trato social. Isso, evidentemente, põe obstáculos insuperáveis ao crescimento da pessoa em meio ao enfrentamento do sistema econômico excludente e competitivo, em especial após revolução industrial.
Cada vez mais dependente de si e sem um ponto de partida equânime em relação aos diversos círculos sociais, o indivíduo navega por águas turvas, com dificuldades estruturais de subsistência e promoção social. Aqui aplico o TER.
O sentimento de pertença a uma sociedade cada vez mais monetizada é de difícil alcance aos mais vulneráveis, que necessitam do amparo, seja estatal ou altruísta, para provisão de sua sobrevivência. Nesta perspectiva, a onda consumista, aliada à exclusão econômica e social em que se encontram milhares de pessoas gera desassossego e crises substanciais quanto à possibilidade de crescer e se estabelecer.
Isso pode ser resolvido pelo entendimento da dicotomia entre Ter e Possuir. Etimologicamente, o verbo Possuir vem do latim tenere, querendo dizer segurar com a mão. É nesses termos que não se deve pensar que alguém, de fato, Possua. Ter é verbo que, filosoficamente, implica efemeridade, passagem. Tudo que o homem tem poderá ser tomado pelos infortúnios da vida. Sendo assim, nada se garante às mãos humanas, portanto a tese de que se possui algo é assaz inverídica.
O que podemos perder, nunca o possuímos. Deste modo, escapando ao furtivo sentido capitalista do pertencimento financeiro, devemos olhar para a frase de Paulo a seu discípulo Timóteo: “O amor ao dinheiro é a raiz de todos os males” (I Tm 6:10 – ARA). Pelo exemplo paulino, fica clara a noção de que podemos ter dinheiro, mas não devemos pertencer a ele. A questão gira em torno de quem manda em quem. Quando isso se resolver dentro de cada alma aflita, o Ter passará a significar passagem, em que é possível construir, perseverar, abdicando do desenfreado dissabor de perder a vida tentando ganhá-la, abandonando família, cônjuges, filhos, em troca de dinheiro, sem que para isso se tenha previsão de futuro, pois a única emancipação real e certa na vida é a morte. Destarte, morre em vida quem desperdiça o tempo tentando comprá-lo, pois não se barganha com quem não tem nada que lhe falte.
Neste ponto, chegamos ao ESTAR. Jamais seremos plenos em um mundo de inconsistências e contingências. Não há suporte para a crença de que Somos algo, pelo contrário, segundo o filósofo existencialista Jean-Paul Sartre, o homem é um eterno vir a ser. Exatamente nisso reside a esperança de quem ainda não desenvolveu sua capacidade total na vida. Driblar as dificuldades é crer no êxito de sua vocação e caminhar rumo à resiliência em dias maus, pois certamente serão muitos.
Não se acovarde o que ainda luta, tampouco se ensoberbeça aquele que Está em algum lugar. Tudo muda sem que se leve em consideração a vontade do homem. Seja esse o pensamento a respeito do bem que é possível alcançar. Diria, a esse respeito, o salmista Davi, monarca em Israel: “Ao anoitecer pode vir o choro, mas a alegria vem pela manhã” (Sl 30:5 – ARA).
Resta-nos refletir sobre o SER. Muitos há que desesperam ao imaginar a solidão da vida, sem que, para isso, encontrem resposta para o ciclo de vida-morte. Crises existenciais são mais comuns à medida que prevalecem incógnitas quanto ao futuro e sua abstração. Não mero acaso são os números alarmantes de depressão no Brasil e no mundo.
De onde viemos e para onde vamos? O suporte a esse questionamento é a certeza de que existe o outro. Em outras palavras, o amar o próximo aperfeiçoa o processo de evolução da alma, dando sentido à existência como fruto da relação interpessoal entre os homens e com Deus. Cristo lançou o alicerce dessa crença ao afirmar: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22:39 – ARA). Ao amar, o homem é direcionado ao transcendente, ao divino, e somente aí perceberá o valor e o sentido do existir. O caminho do outro é o encontro consigo.
Celebremos, portanto, o que temos, onde estamos e o nos tornamos a cada dia. Façamos como Cristo, em sua missão; ajamos tal como imaginaram a vida alguns célebres pensadores, a exemplo de C. S. Lewis, Kierkegaard e Tocqueville, que não sucumbiram ao paradigma laicista predominante, mas se atreveram a crer em meio à desconfiança e desesperança.
O que temos poderá ajudar onde estamos, sendo que o que nos tornamos servirá para nossa Felicidade.